Um Olhar Crônico Esportivo

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terça-feira, outubro 24, 2006

Um país "pontos corridos"


Sabem o que acho interessante nessa história dos pontos corridos?

Que ele é um flash de seriedade e, vá lá, de moralidade, nesse país de tantas maracutaias, jeitinhos, armações, arrumações...

Acho até que muitos defensores do formato se apegam a ele por se apegarem, também e inconscientemente, a um ideal de país.

“Puxa, como seria bom se o Brasil fosse um país “pontos corridos”, mesmo que chato e sem graça, mas ganhando o melhor e com as regras do jogo sendo cumpridas.”

Isso me veio de estalo nesse final de semana, no sítio, enquanto pegava um pouco de bosta de vaca de um canto e jogava em outro, para adubar uns pés de laranja meio deslocados. Aliás, excelente exercício pra gente com veleidades intelectuais e traseiro conformado pela cadeira do computador.

Com certeza deve ter algum significado profundo e ainda oculto, para mim, ao menos, nesse negócio de pegar toneladas de bosta (desculpe, aqui não há como usar esterco ou estrume) de um lugar, suar, deixar costas e braços doloridos levando para outro e, depois de alguns meses colher umas laranjas deliciosas, descascar e chupar ali mesmo. E enquanto as laranjas não chegam (seletas, as mais gostosas, embora o clima do sítio seja um pouco frio para elas, que se dão às mil maravilhas no calorão brabo de Rio Bonito e Itaboraí), um pouco de exercício vai bem.

Fazendo esse nobre serviço desviei meu pensamento das vacas, das laranjas e do peso da bosta na pá, uma atrás da outra atrás da outra atrás da outra, e pensei no futebol e nessa coisa de um país pontos corridos.

Eu não duvido nem um pouco que em algum momento futuro muitos dos atuais defensores desse formato vão pedir uma fórmula mais emocionante, talvez até mesmo eu mude de idéia. Por enquanto, porém, a manutenção do formato atual pode ser didática e também pode ser uma comprovação de que podemos fazer campeonatos com seriedade. As muitas mudanças do passado, a bagunça brutal de um formato a cada ano, um mais estrambótico que o outro, desacreditaram essa possibilidade. Posso estar exagerando, mas acho que o sistema de pontos corridos devolve credibilidade ao mundo da bola. Ou dá a credibilidade que esse mundo nunca teve e, se teve, perdeu há décadas.

Essa fórmula simples – ganha quem ganha mais pontos e perde quem perde mais pontos – e banal, sem mistério, tem funcionado. As pessoas, finalmente, acostumaram-se com ela e começam a aceita-la, hipótese que parecia improvável há apenas dois ou três anos. Ao menos em teoria, os clubes se planejam, se preparam para a temporada seguinte, negociam seus contratos com horizontes claros e nítidos, sem o receio de, ter que parar todas as atividades de repente, porque o campeonato acabou e só continuará para 8 ou 4 privilegiados. E, enquanto isso, as despesas correntes... correm, como soem fazer desde sempre e se acumulam, como é, igualmente, seu hábito mais que ancestral.

Bom, é claro que nada é assim tão simples e cristalino. É claro, também, que o Brasil é muito mais e precisa muito mais do que implantar pontos corridos. Mas não deixa de ser um alento esquecer Brasília e acompanhar o desenrolar desse campeonato, onde cada jogo é um drama, cada partida é decisiva para uma coisa ou outra, decisão que se repete no jogo seguinte e no outro...

Sim, o futebol é mesmo uma bênção. Ainda bem.

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